você não viu
[nem deu tempo]
você não viu
[nem deu tempo]
amanhã
amanhã faço 36 anos
faço 36 anos e tenho medo
do escuro
caminho rápido
rápido porque tenho medo
medo de alguém me encontrar
me encontrar e me engolir
me engolir por inteiro
e eu sumi
sumi a passos rápidos
rápido desapareci
amanhã
amanhã é meu aniversário
é noite
é noite e eu tenho medo
do escuro
procuro um poema que esteja no máximo a 20 quilômetros de distância.
quando deito
assim de lado
sobre meu ombro direito
pernas encostadas paralelas
mexo o dedão do pé
e ao mesmo tempo
esfrego o indicador da mão
lembro de você
*esse poema foi publicado no zine “eclipse” dos alunos do Clipe/poesia 2017 da Casa das Rosas.
se soltam
uma a uma
do pano de chão
que acabo de lavar
uma
a
uma
enquanto o funk toca
na ocupação no prédio da frente
uma
a
uma
é preciso paciência
pra cair assim
uma
a
uma
esquecer o funk
e continuar a cair
uma
a
uma
gota.
quando florescem
é para o chão que olho
uma partida em silêncio
como se nunca tivesse
passado por aqui
a flor do jacarandá.
arrumei as taças de champanhe
dentro da caixa
deitadas
como corpos
pé com cabeça
cabeça com pé
até encher
até o topo
intercaladas com plástico bolha.
adoro abrir aquele álbum
com fotos preto e branco
amareladas
com você vestida de
branco
mesmo sabendo que
o casamento não durou
mesmo não acreditando em
casamento
mesmo achando que
casamento é só um show
– falei que nunca casaria
casei e não deu certo –
mesmo assim
adoro abrir aquele álbum
com fotos preto e branco
amareladas
escrever sobre você
em falsete
tudo certo
todos os detalhes
uma vida a dois
só faltava
eu + você
só isso
se soubesse que aquela
seria a última vez
escreveria em falsete
em clichês
nem tive tempo
de viver o que
imaginei pra nós dois
em falsete
que cafona.